terça-feira, 27 de setembro de 2011

A última armadilha do sistema

O macho demoníaco. Richard Wrangham e Dale Peterson. Tradução de M.H.C. Côrtes. Ed. Objetiva. Rio de Janeiro, 1998.

A cada dia percebe-se com assombro o crescimento da violência em nossa sociedade. Os exemplos se repetem nos jornais. São festas, em princípio pacíficas, que terminam com brigas violentas. É o alarmante índice de homicídios entre jovens. São as reações de ódio exagerado, nas pequenas discussões cotidianas. Afinal, o que leva o homem à agressão? Haverá em nós uma tendência natural para reações violentas? Os autores apresentam neste livro respostas surpreendentes a estas questões. Partindo de instigante pesquisa sobre o comportamento social agressivo dos primatas, os autores revelam muito sobre a própria condição humana.

Contradizendo a crenças de que chipanzés na selva são criaturas mansas e pacíficas, Wrangham e Peterson observaram, desde 1971, chimpanzés machos da África praticando estupros, ataques nas fronteiras de seus territórios, surras brutais, guerras contra grupos rivais. Ao longo do livro eles sugerem que a violência dos chipanzés precedeu o comportamento agressivo do homem. Por esta perspectiva, o homem contemporâneo é o atordoado sobrevivente de uma longínqua tendência à agressão. Para sustentar esta tese, os autores examinam casos de estupro entre orangotangos, infanticídios entre gorilas, práticas violentas provocadas por machos, estabelecendo paralelos com histórias de agressão entre tribos indígenas e, mesmo, em nossa sociedade “civilizada”.



Em suas últimas páginas:

“Esse grande cérebro humano é o produto mais aterrorizador da natureza.

Ao mesmo tempo, porém, ele é o melhor e mais promissor dom da natureza. Se temos a maldição de um temperamento demoníaco masculino e uma capacidade maquiavélica para expressá-lo, somos também abençoados com uma inteligência que é capaz de, através da aquisição da sabedoria, afastar-nos da mácula de 5 milhões de anos do nosso passado de grande primata.

A inteligência é algo que nos é familiar, um livro, um velho amigo. Porém, o que é a sabedoria?

Se a inteligência é a capacidade de falar, a sabedoria é a capacidade de ouvir. Se a inteligência é a capacidade de enxergar, a sabedoria é a capacidade de ver ao longe. Se a inteligência é um olho, a sabedoria é um telescópio. A sabedoria representa a capacidade de deixarmos a ilha de nosso próprio ser e sairmos mar afora. Para que assim nos vejamos como outros nos vêem, e para ver outros dentro e além da primeira dimensão ou contexto de tempo, de espaço e de ser.

Em outras palavras, a sabedoria é a perspectiva.

O temperamento nos diz o que nos importa. A inteligência ajuda a gerar opções. E a sabedoria é capaz de nos levar a considerar longínquos desfechos, para nós mesmos, para nossos filhos, para os filhos de nossos filhos... e talvez até mesmo para as mentes na floresta”.



Apesar de revelar a natureza sanguinária latente em todo homem, O Macho Demoníaco traz uma mensagem de esperança. É um instigante desafio que cada um de nós reveja sua vida com mais inteligência, afastando-se o mais possível da irracionalidade agressiva desses nossos parentes mais próximos.